segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Pleno emprego traz desafio ao setor produtivo

PARADIGMAS Mercado de trabalho mudou. Suape atrai trabalhadores e empresários se desdobram para manter pessoal

Adriana Guarda
adrianaguarda@jc.com.br


Josuel Oliveira não entendia nada sobre sistemas elétricos. Estava acostumado à dinâmica do varejo, onde trabalhava como caixa de supermercado. Foi ouvindo a conversa de seu pai sobre as oportunidades em Suape, que se interessou pelo complexo. Conseguiu uma vaga de ajudante de eletricista da Odebrecht na obra da PetroquímicaSuape. Migrou do comércio para a construção civil, com ganho de salário, benefícios e perspectiva de crescimento profissional.
A história desse jovem de 20 anos, que comemora seu segundo emprego com carteira assinada, é parte do novo cenário do mercado de trabalho na Região Metropolitana do Recife (RMR). Para o empregado o momento é único: recorde de emprego, ganho salarial, melhoria da renda e perspectiva de consumo. Do lado das empresas, o desafio é enfrentar as dores do pleno emprego. Guerra desenfreada por profissionais, investimento em qualificação e alta rotatividade são agora as regras do jogo.
Na teoria econômica, se configura o pleno emprego quando as taxas de desocupação estão baixas e praticamente todas as pessoas em idade produtiva estão trabalhando. Na última Pesquisa Mensal de Emprego (PME) divulgada pelo IBGE, a taxa de desemprego na RMR em novembro de 2011 foi de 5,5%. O percentual é o menor registrado na série histórica realizada desde 2002. O maior índice tinha sido registrado em 2005, quando alcançou 13,9% (veja arte abaixo).
A diminuição do desemprego foi motivada pelo grande número de empreendimentos em implantação no Grande Recife, tendo o Complexo de Suape como o principal indutor dessa transformação. O efeito negativo é a fuga de funcionários para os municípios de Ipojuca e Cabo de Santo Agostinho. Os empresários reclamam de ter seus colaboradores “abduzidos” por Suape. O empresário do Extrabom, Rodolfo Borba, diz que a meta da rede de supermercados é reter 15% dos funcionários. “A rotatividade está tão grande que vamos adotar política para garantir a permanência, principalmente nos cargos de gerência e outros mais estratégicos”, diz, resignado.
A construção civil, responsável por içar o PIB e a geração de empregos no Estado, é o setor que promove a maior dança de cadeiras, atraindo profissionais de menor escolaridade dos segmentos de turismo, comércio, serviços e sucroalcooleiro. A canibalização também acontece dentro da própria atividade com fluxo migratório de uma obra para outra. A taxa média anual de aumento da geração de emprego na construção é de 23,7%.
“Se eu não tenho trabalhador aqui, vou buscar no quintal do vizinho. Isso é um movimento normal num cenário de pleno emprego, mas que a gente não percebia aqui porque antes o Grande Recife amargava altas taxas de desemprego”, analisa o sócio-diretor da Ceplan Consultoria, Jorge Jatobá, apontando para uma mudança de paradigma. Os empresários reclamam da falta de comprometimento dos trabalhadores, dizendo que impera a lei do “quem dá mais”.
Empresários do setor de TI se queixam de perder equipes inteiras para as empresas de Suape. Na maioria das vezes são profissionais formados na casa e que vão embora. O técnico em TI Tiago Sena da Silva, de 30 anos, deixou a empresa onde trabalhava como analista há 4 anos para aceitar uma vaga de técnico na obra da PetroquímicaSuape. “Estou num cargo menor, mas meu salário aumentou 40% e tenho benefícios como plano de saúde e participação nos lucros.”
Nem o Senai, formador de mão de obra para o setor produtivo, escapou da canibalização. O diretor regional, Sérgio Gaudêncio, conta que entre 2010 e 2011 a instituição perdeu 44 professores e colaboradores para o mercado. “É difícil concorrer com os grandes empreendimentos de Suape, que oferece melhores salários e benefícios.” Em 2009, o Senai fez uma revisão do plano de cargos e carreiras e da política salarial e vai repetir a iniciativa este ano. “As empresas deveriam evitar atrair gente da nossa equipe, sob pena de comprometer a qualificação de seus próprios funcionários que é feita por nós”, completa. Hoje, o quadro do Senai é de 550 professores.
Aluno formado pelo Senai, Jean Gomes de Souza, de 33 anos, cedeu ao chamamento do mercado. Depois de 15 anos de docência, deixou a instituição para ocupar uma vaga de coordenador técnico no setor de treinamento no Consórcio Conest (responsável por parte da obra da Refinaria Abreu e Lima). “Meu salário quase dobrou e as perspectivas se expandiram. Aqui estou dentro da atividade prática”, comemora, sem remorso pela troca.